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Dica de Gestão #14: Indisciplina gera indisciplina

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Muitos líderes não entendem porque seus departamentos ou empresas são difíceis de controlar, não entendem porque existe indisciplina, que parece ser um problema cultural sério para o qual o único caminho é a demissão de todos e a reformulação da equipe. Pode ser que a solução seja a troca dos colaboradores, mas não precisa ser assim. Em quase 30 anos de experiência com o desenvolvimento de softwares, tenho tido contato com centenas de empresários dos mais diversos segmentos e pude perceber algo que sempre me deixou muito intrigado: empresas muito organizadas, limpas, estruturadas e com foco, sendo administradas por líderes absolutamente diferentes uns dos outros. De fato, eu não conseguia encontrar um tipo de líder que pudesse considerar qual paradigma seria seguido integralmente. Isso me deixava certo de haver algum elemento que eu não conhecia e que poderia influenciar diretamente no ambiente de trabalho, favorecendo a empresa e a carreira das pessoas.

Recentemente comecei a prestar atenção na Alterdata – empresa que fundei e hoje possui cerca de 1.300 funcionários – bem como nas empresas de clientes mais próximos, nas quais, em alguns departamentos, a disciplina é administrada com seriedade e os objetivos são atingidos; onde as coisas se realizam com mais regularidade. São lugares onde o ambiente é mais limpo, harmônico, cooperativo e disciplinado. Tentei associar isso ao comportamento do líder. No passo seguinte, busquei literatura sobre o assunto e pude compreender que quanto mais o líder é tolerante com a indisciplina, mais ela acontece; quanto mais se permite a sujeira, mais ela toma conta; quanto mais se aceita funcionários apáticos, mais os indiferentes assomam – e tudo por uma questão de psicologia social.

Às vezes, equipes compostas por profissionais de alto nível não têm um desempenho satisfatório. Isso tem a ver com o fato de que o coletivo influencia o indivíduo. Por mais que se possa dizer que não somos influenciados pelo meio, que temos personalidade própria, estudos científicos demonstram o contrário. De modo que o líder tem que compreender que ele é a essência da organização de um setor e que mesmo que esteja lidando com os melhores profissionais do planeta, o ambiente social em que estão inseridos pode fazer com que todos tenham um desempenho pior ou melhor. Esta teoria vem sendo comprovada por pesquisas científicas – e mesmo assim alguns líderes ainda não entendem a importância deste conceito.

Em 1969, na Universidade de Stanford, nos EUA, o prof. Phillip Zimbrado realizou uma experiência de psicologia social que mudaria a forma de pensar de muitos estudiosos. Ele deixou dois veículos idênticos abandonados em via pública. Um ficou no Bronx, periferia pobre e conflituosa de Nova York; o outro em Palo Alto, área rica e tranquila na Califórnia. Note-se que eram dois carros iguais deixados ao acaso em dois bairros com populações distintas. Foi colocada uma equipe de especialistas em psicologia social em cada local estudando a conduta das pessoas diante dos veículos. O veículo abandonado no Bronx foi vandalizado em poucas horas: perdeu rodas, motor, espelhos, rádio… e levaram tudo o que fosse aproveitável, e o que não puderam levar, destruíram. Já o que foi deixado em Palo Alto manteve-se intacto. Estes fatos poderiam ter levado à conclusão de que o vandalismo estaria ligado a questões de ordem social, cultural ou financeira. Mas a pesquisa não parou por aí. Após uma semana, quando a viatura de Palo Alto ainda estava intacta, os pesquisadores quebraram um dos vidros do automóvel. Isso desencadeou o mesmo processo que já ocorrera no Bronx: roubo, violência e vandalismo reduziram o veículo a um estado deplorável, assim como o carro que fora destroçado no Bronx. Daí veio a questão: por que o vidro partido, conforme mencionado, num bairro supostamente seguro, é capaz de deflagrar todo o processo delituoso? Não se trata de pobreza. Tudo está ligado à psicologia humana e às relações sociais. Um vidro quebrado numa viatura abandonada passa a ideia de deterioração, de desinteresse, de despreocupação que quebra os códigos de convivência civilizada, inspirando ausência de lei e de regras. Instala-se o “vale tudo”. Cada novo ataque que o automóvel sofre, reafirma e multiplica essa ideia, até que a escalada de atos cada vez piores se torna incontrolável, desembocando na violência irracional.

Esta se tornou a “Teoria das Janelas Partidas” que sinaliza o que pode acontecer em qualquer ambiente, inclusive no trabalho. Se o líder permite que no setor alguns cheguem atrasados, os demais que são assíduos farão o mesmo; se permite que alguns ajam com falta de respeito, até os mais tímidos começarão a agir assim também; se as pessoas não são punidas por seus erros, os demais, que acertam, passarão a trabalhar com menos empenho. Assim, é fundamental que cada um seja tratado de acordo com seus erros e acertos individuais. Já a presença do líder deve ser conciliadora, porém forte e exigente, o que fará o conjunto andar melhor. É importante que o líder compreenda que a justiça entre as pessoas de uma equipe é que moverá todos a uma maior produtividade, sabendo que cada um tem seu valor particular. Isso se comprova por outra experiência: Certa vez um professor dava aula quando os alunos começaram a questionar que o sistema socialista era melhor que o capitalista. Diziam que com o governo intermediando a riqueza ninguém seria pobre e ninguém seria rico, atingindo-se o igualitarismo. Consequentemente, o professor propôs fazerem um experimento socialista na classe, mas, no lugar de dinheiro, seriam usadas as notas das provas. Assim, as notas de toda a classe seriam concedidas unicamente com base na média da turma e, portanto, seriam “justas”. Todos receberiam as mesmas notas, o que significava, teoricamente, que ninguém seria reprovado, da mesma forma que ninguém receberia um “A”. Calculada a média da primeira prova, todos receberam um “B”. Quem estudou com dedicação ficou indignado, porém os alunos que não se esforçaram ficaram muito felizes com o resultado. Quando a segunda prova foi aplicada, os preguiçosos estudaram ainda menos, pois teriam notas boas de qualquer forma. Já aqueles que tinham estudado bastante no início resolveram embarcar no trem da alegria das notas. Resultado: a segunda média foi um “D”. Ninguém gostou. Depois da terceira prova, a nota foi “F” – e as médias não voltaram aos níveis mais altos. As desavenças entre os alunos, a busca por culpados, até mesmo os palavrões, passaram a fazer parte da atmosfera das aulas. O clamor por “justiça” da parte dos alunos tornou-se causa de reclamações e inimizades se instalaram na turma. Por fim, ninguém mais queria estudar para beneficiar os outros, resultando na reprovação de todos, para total surpresa da classe.

Disso podem-se extrair determinadas conclusões acerca do coletivo, que tanto pode ser o ambiente de trabalho em uma empresa como o setor do qual fazemos parte:

1) Não se pode recompensar o setor inteiro em detrimento dos seus melhores integrantes;
2) Não é possível que para cada funcionário recebendo prêmio sem trabalhar exista outro trabalhando em excesso;
3) Não se consegue produtividade máxima de um setor senão quando há exigência para que todos deem o seu máximo, individualmente e em conjunto;
4) É impossível multiplicar produtividade tentando dividi-la entre todos;
5) Quando metade dos funcionários entende a ideia de que não precisa trabalhar porque a outra metade sustentará a produtividade e percebe que não vale mais a pena trabalhar, o caos estará formado.

Nota-se, assim, que é importante que o líder crie um ambiente competitivo de forma saudável. É mais eficaz. Este experimento poderia ter sido feito numa escola ou numa empresa, com ricos ou pobres, cultos ou não, que o resultado seria o mesmo. Afinal, estamos falando de psicologia social, que assegura que o caos se instaura dependendo do que o líder permite.
Sendo assim, é importante que o líder mantenha o ambiente controlado, as pessoas medidas, as rotinas assentadas para que todos sintam que estão sendo monitorados e percebam que predomina a justiça, para garantir que vale a pena trabalhar.
Mesmo em ambientes de pessoas muito cultas e preparadas, é necessário controle e vigilância, pois é isso que a constituição humana exige. Lembre-se do que acontece nas estradas brasileiras onde a maioria das pessoas não respeita o limite de velocidade porque acredita que não serão apanhadas, e isso independe do nível cultural delas. Agora, pense: será que na empresa em que trabalha, esta mesma pessoa, que acredita que não haja controle sobre suas rotinas, também não infringirá as regras? Um outro estudo de grande importância para este artigo foi feito por Dan Ariely, um dos mais respeitados pesquisadores do MIT – Massachusetts Institute of Technology – sobre comportamento humano. A teoria busca provar que existe uma irracionalidade previsível nas pessoas e em seus comportamentos.

Mesmo havendo consciência de que algo é errado, as pessoas o fazem quando percebem que não há controle. Dan começou um estudo sobre trapaças: queria entender porque existem espertezas em ambientes coletivos, onde pessoas inteligentes, conscientes, cultas e honestas trapaceiam. Ele queria saber se poucas pessoas ruins contaminavam o grupo ou se havia um comportamento errado por falta de controle. Dan entregou uma folha de papel a cada pessoa de um grande auditório contendo vinte questões de matemática simples que todo mundo conseguiria resolver, mas sabendo desde o início que não teriam tempo suficiente para tal. Depois de exatos cinco minutos, ele pedia para devolverem as folhas e que daria 1 dólar para cada resposta correta. As pessoas obedeciam e ele acabavam pagando 4 dólares na média. Outras pessoas ele induzia à trapaça: entregava-lhes as folhas e quando os cinco minutos acabavam, ele dizia: “Destruam a folha de papel, coloquem os pedaços no bolso e digam quantas questões vocês responderam corretamente.” Agora, as pessoas “resolviam”, em média, sete dos problemas. Então, percebeu-se que num grupo grande, não é que existam poucas pessoas trapaceando muito, mas sim muitas pessoas trapaceando pouco; ou, de outra forma: não é uma questão de ter uma laranja podre no meio das outras que estraga um grupo, mas é a sensação de falta de vigilância que estimula a trapaça.

Vários outros experimentos de Dan Ariely comprovaram que a questão diz respeito às seguintes perguntas: “Qual a probabilidade de eu ser pego?”, “Quanto eu posso ganhar através da fraude?” e “Qual a punição eu receberia caso fosse flagrado?” A pessoa pensa no custo-benefício de forma inconsciente. Nessa linha, estudos demonstraram que todos querem olhar-se no espelho e sentir-se bem, sem trapacear. Por outro lado, podem enganar um pouco sem “peso na consciência”, como se houvesse um nível de trapaça aceitável. Contudo, daí para frente, ultrapassada a fronteira, sentem desconforto moral. Porém, quando o estudo da trapaça os fez jurar sobre a Bíblia, as trapaças desapareceram, demonstrando que havia algo psicológico que os impedia de cometer o pequeno ato, como se Deus os estivesse vigiando. Para excluir aspectos religiosos, fizeram-nos, em vez do juramento, assinar um código de honra. De novo não houve trapaças. Este estudo evidencia que a empresa precisa ter mecanismos para que todos se sintam comprometidos, monitorados, com envolvimento moral e psicológico para não ludibriar os seus líderes, colegas, clientes e fornecedores. Para tanto é fundamental que a empresa tenha mecanismos de aferição de desempenho pessoal, que saiba exatamente o que todos estão fazendo, como estão fazendo e com que velocidade. Isso não tem relação com ser uma empresa rigorosa, refere-se a ser uma empresa que entende como funciona o cérebro e o coração das pessoas, além das emoções humanas.

Não importa a atividade econômica que uma empresa exerce, ela sempre será constituída de pessoas, razão pela qual é necessário equilibrar duas grandes vertentes:

1) Precisamos de monitoramento, rotinas e indicadores de desempenho individual, disciplina, bem como organização;
2) Precisamos saber mais das pessoas, se necessário, empregar força na medida certa; saber a importância de ser acessível, de encantar corações, motivar o grupo a seguir na direção certa, sabendo que, afinal, não se faz uma empresa sem equipes fortes.

Quando digo SER algo é porque precisamos ter estas habilidades mínimas e quando digo SABER é porque temos que aprender o tempo inteiro e nossa HUMILDADE permitirá que isso aconteça.

Finalizando, se você é um líder de setor, um executivo de empresa ou mesmo um dono de negócio, saiba que você precisará controlar todos e tudo o que acontece à sua volta, porque indisciplina traz indisciplina, falta de produtividade resulta em retração – e a essência, a razão última, está na falta de justiça individual. Para ser mais categórico, isso determina a anarquia na coletividade. Assim, não aceite ser líder de um ambiente sem controle.

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Sobre o autor
CEO e CoFounder da Alterdata Software
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