Contabilidade

A CTPS digital e as obrigações acessórias

7 Mins de leitura

Um dos documentos mais importantes para o trabalhador brasileiro é a Carteira de Trabalho e Previdência Social. Ela registra detalhes das relações profissionais do colaborador, bem como sua filiação ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), e agora está de cara nova — em setembro de 2019, o Governo Federal implantou definitivamente a lei da CTPS Digital.

Esse modelo eletrônico substitui do documento físico e foi criado com objetivo de modernizar e facilitar o acesso ao histórico profissional dos trabalhadores. Trata-se de um aplicativo acessível a todos os brasileiros, mas, quais as vantagens desse novo sistema? Como ele funciona e o que muda para o empregador? É sobre isso que falaremos neste artigo!

Por que surgiu a CTPS Digital?

A Portaria nº 1.065, publicada em 24 de setembro de 2019, implanta em definitivo a CTPS Digital. É um importante projeto de desburocratização e substituição do documento físico para um documento digital, acessível através de internet, principalmente por smartphones — em sistemas Android e iOS.

A proposta já estava em elaboração desde 2017, mas apenas dois anos depois foi definitivamente implementada. A partir da sua vigência, passa a surtir efeitos práticos, apesar de causar dúvidas diversas, o que é algo comum em processos de mudança.

A CTPS Digital também está prevista na Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, a Lei nº 13874/2019, que determinou que tal documento fosse emitido preferencialmente em meio eletrônico.

Como funciona?

A CTPS Digital é uma versão da carteira de trabalho impressa. Isso faz parte de uma forte tendência de transformação digital, em que documentos físicos ganham suas versões virtuais. Assim, o que antes era anotado no papel, como data de admissão, período de férias e salário, agora é registrado virtualmente.

Sendo assim, a carteira de trabalho física não precisa mais ser apresentada — isso se o empregador já utilizar o sistema do eSocial, programa do Governo no qual as empresas fornecem informações trabalhistas, previdenciárias e fiscais de forma on-line.

O acompanhamento das informações é feito por meio de um aplicativo para smartphones e tablets ou então pelo site da Secretaria do Trabalho. Para isso, será necessária a abertura de uma conta na página oficial do governo.

Quais os benefícios?

As vantagens da CTPS Digital podem ser percebidas tanto do ponto de vista do trabalhador quanto da empresa. Por muitos anos, o empregador tinha uma grande dificuldade de reunir todos os dados e documentos trabalhistas do profissional.

A digitalização das informações também garante maior segurança às informações. Caso o trabalhador perdesse seu documento impresso, por exemplo, ele precisaria voltar a todas as empresas onde trabalhou para reinserir os dados na sua nova CTPS. Agora, tudo fica automaticamente e permanentemente salvo no sistema, bastando o uso do CPF para realizar o acesso.

Outro aspecto importante sobre a segurança das informações é que o documento físico estava sujeito a furtos, roubos ou até fraudes e o trabalhador sempre saía perdendo. Contudo, o registro no sistema assegura a integridade dos dados.

Ele também facilita a rotina no departamento pessoal. Afinal, sempre que havia alterações no contrato, como salários, férias e bonificações, era necessário reunir todos os documentos para fazer os ajustes. Com a CTPS Digital, a inserção dos dados no eSocial já basta para fazer as atualizações.

O que muda na contratação para o empregador?

A CTPS Digital traz grandes mudanças para empregadores e trabalhadores e transformará bastante o dia a dia dos profissionais de Recursos Humanos. Confira o que fica diferente a partir de agora!

Integração ao eSocial

O registro dos dados da carteira de trabalho digital é feito por meio do eSocial, a plataforma do Governo que integra as informações previdenciárias, trabalhistas e fiscais que as empresas precisam enviar.

Uma vez que utilizar o eSocial já é uma obrigação para os negócios, a empresa só continuará enviando os dados pela plataforma e as informações que são fornecidas na CTPS já ficarão disponíveis aos trabalhadores.

CTPS impressa

O uso da CTPS física será direcionado apenas para casos especiais, por exemplo:

  • empregadores que não são obrigados a utilizar o eSocial podem continuar usando a versão impressa;
  • para registro e pesquisa tanto de contratos mais antigos quanto daqueles que ainda estavam vigentes na data da publicação da portaria referente à CTPS Digital.

Rotina de anotações

Aquela velha expressão “assinar a carteira” começa a ficar realmente no passado. Isso porque a empresa não precisará ter um processo específico para gerenciar carteiras de trabalho de seus funcionários, como registrar férias, alterações de salário e dispensa. Esses dados já serão integrados ao eSocial.

Lembre-se apenas de que algumas dessas informações lançadas no eSocial não vão ficar disponíveis tão rapidamente na CTPS Digital do colaborador. Existem prazos relativos à prestação de informações do empregador que podem motivar o atraso do registro.

Normalmente, a empresa precisa registrar os eventos até o dia 15 do mês seguinte da ocorrência, por exemplo. Em caso de desligamento, em até 10 dias. Deve-se levar em conta também que, após o lançamento da informação do eSocial, há um tempo de processamento dos dados até que fiquem disponíveis no sistema da CTPS Digital.

As informações são incluídas no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) antes de prosseguir. Isso é importante para haver uma integração com os dados utilizados pelo INSS, para o caso de concessão de benefícios, por exemplo.

E como fica para o trabalhador?

É também importante para o trabalhador conhecer as regras e habilitar seu documento a fim de consultar suas informações e acompanhar seu relacionamento com a empresa em que atua. Os principais aspectos que ele deve dar atenção são:

  • habilitação do registro: a CTPS Digital já está habilitada para todos os cidadãos com CPF, então, basta habilitá-la;
  • carteira de trabalho física: o recomendado é guardar o documento para ser utilizado como comprovação dos seus vínculos empregatícios anteriores;
  • admissão: para ser admitido em uma empresa, basta informar o CPF e o empregador registrará as informações pelo eSocial;
  • erros nos dados: ao comparar os dados entre as carteiras física e digital, talvez encontre divergências nas informações. Se isso acontecer, o trabalhador deve entrar em contato com o empregador para fazer as devidas correções;
  • número da CTPS Digital: diferentemente do modelo impresso, o documento virtual não tem número, pois utiliza o CPF como identificação.

Quais os desafios na implementação?

Com a implantação do novo modelo digital, passamos por um período de transição que divide os trabalhadores em duas “classes”: aqueles que possuem a CTPS física e os que não possuem — estes últimos por serem novos trabalhadores, que ainda vão entrar no mercado de trabalho.

No primeiro caso, o trabalhador tem os contratos de trabalho devidamente assinados no documento físico, que apresenta um numerador único e também a prerrogativa do seu uso como documento de identificação civil. Isso porque o numerador contido na CTPS física servia de identificação e ainda era declarado em várias obrigações acessórias, como CAGED, SEFIP, entre outras.

Já aqueles que ainda vão ter o seu primeiro emprego e que não têm a carteira física, em breve vão se apresentar ao trabalho sem portá-la. Afinal, não contarão com o número da CTPS física, havendo alguns complicadores.

Um deles é inerente às obrigações acessórias, como a SEFIP, o CAGED e a RAIS, que exigem o numerador único da CTPS, série ou até mesmo a UF de emissão do documento como informação obrigatória para envio e validação. Isso significa que, para gerar o CAGED, por exemplo, e passar pelo validador, será necessário informar essa numeração/série/UF.

Nesse sentido, a Portaria nº 1065 dispõe que a Carteira de Trabalho Digital terá como identificação o número do CPF do trabalhador. Curiosamente isso vem ao encontro do Decreto 9.723/2019, o qual determina que o CPF seja o único identificador das pessoas físicas com o Governo.

Prova disso é o layout do eSocial (Nota Técnica 15/2019), que foi recentemente flexibilizado. Ele também foca na centralização de identificação através do CPF, tornando os demais identificadores dispensáveis, com a transformação dos seus campos de “obrigatório” para “facultativo”.

Então, como ficam as obrigações acessórias?

Para satisfazer as antigas obrigações, bem como as novas, entendemos que o CPF deverá ser informado no numerador da CTPS, embora tenha mais dígitos que o disponível. Se olharmos o número da carteira e a série, será possível informar completamente o campo.

Pegando como exemplo o CAGED, o campo tem 7 dígitos para o número e 4 para a série, o que permite a informação, pois o CPF tem 11 dígitos. Ao partir desse entendimento foi disciplinado através de notícia publicada no sítio do CAGED e também do SEFIP que a informação da CTPS Digital nessas obrigações acessórias será prestada de tal maneira que os 7 primeiros dígitos do CPF irão para o número da CTPS e os 4 restantes para o campo de série. 

Quanto à UF, basta colocar o Estado do trabalhador ou da empresa. Procedendo dessa forma será possível gerar essas obrigações com tranquilidade, inclusive a SEFIP, mesmo sabendo que essas informações da CTPS desaparecerão futuramente, pois tudo será consolidado para manter a conformidade, concentrando as informações no CPF do empregado.

Vale ressaltar que ainda haverá em alguns casos o uso em caráter excepcional da CTPS física. Isso ocorrerá enquanto o empregador não for obrigado ao uso do eSocial. Sendo assim, aquele empregado recentemente contratado que não tenha o documento físico — e o seu empregador não for obrigado ainda ao uso da plataforma eSocial — deverá solicitar a emissão de uma CTPS física.

Para isso, basta ligar para o número 158 e realizar um agendamento. Contudo, acreditamos que, em pouco tempo, mesmo nesses casos, o uso da CTPS Digital ocorrerá para todos os empregados ativos no mercado de trabalho.

Como se manter atualizado sobre essas questões?

Muitos trabalhadores desconhecem essas mudanças, especialmente aqueles com contrato vigente à época da implementação da ferramenta. Além disso, muitos empregadores ainda têm dúvidas sobre como proceder em alguns casos. Certamente, isso representa um desafio para o departamento pessoal.

Com isso em mente, os gestores podem tomar iniciativas que informem seus colaboradores sobre essas mudanças, explicando um passo a passo de como habilitar sua CTPS Digital. Os responsáveis precisam estar sempre preparados para dar as instruções necessárias, por esse motivo, prepare sua equipe com informações atualizadas.

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Sobre o autor
Gerente do setor de Inteligência Fiscal da Alterdata.
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