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Dica de Gestão #11: Distinção entre finanças pessoais e da empresa

8 Mins de leitura

Saber se o seu negócio está indo bem é fundamental para planejar ações e estabelecer objetivos, mas nem todos os empresários distinguem as finanças da empresa e as pessoais. Para cada dez novos negócios abertos, seis fecham suas portas no Brasil. Em 2002 surgiram 721 mil empresas, porém 461 mil foram extintas, sendo 12,5% microempresas que empregavam até 4 pessoas. O comércio foi o setor que mais registrou mortalidade.

Se você é dono de uma empresa ou mesmo funcionário responsável pelas finanças da firma em que trabalha, saiba que confundir as despesas que são da operação da companhia com as pessoais dos sócios cria uma nuvem de fumaça que dificulta entender a situação, complicando gravemente a formação de custos e gerando desconfortos que podem comprometer a sociedade.

Para compreender bem este conceito, é importante entender a clara distinção existente entre Pró-labore e Distribuição de Lucros. O primeiro tem a ver com o lado trabalhador dos donos, pois a maioria trabalha nas respectivas organizações de que são proprietários e, portanto, merecem um salário (Pró-labore) que nada tem a ver com o que retiram dos lucros da firma. O pró-labore deve ser compatível com o salário que seria pago a um funcionário para desempenhar a mesma função deste proprietário.

Lembrando que o pró-labore deve estar embutido no custo da empresa. Já a retirada de Distribuição de Lucros é feita em função de a empresa ter resultados para esta ação.

Como executivo e fundador da Alterdata Software, tendo experiência de cerca de 30 anos na construção de sistemas de gestão empresarial, tenho visto situações interessantes de empresas aparentemente quebradas, mas que, na verdade, são viáveis desde que os sócios compreendam a distinção entre Pró-labore e Lucro.

Existe outra situação: empresários que acreditam que suas empresas não lhes pagam o que devem, mas fazem a empresa pagar por despesas que não são da companhia, criando problemas estruturais.

Conheço um caso de uma empresa onde o proprietário retirava cerca de R$ 20 mil mensais e ainda obrigava a empresa a pagar os colégios dos filhos, o clube que frequentava, contas de abastecimento e condomínio do prédio em que morava. No momento de calcular os custos dos produtos estas despesas eram rateadas junto, fazendo com que os valores ficassem muito altos, perdendo competitividade diante dos concorrentes. Ele não compreendia porque os concorrentes tinham preços menores e a forma de fazê-lo compreender que havia algo errado foi perguntar se ele contratasse um funcionário para desempenhar a mesma função que exercia, pagaria para ele todas as despesas deste profissional como fazia consigo mesmo. A resposta foi negativa. Disse que ele deveria contratar alguém para ocupar seu lugar e a empresa teria uma grande economia. Depois de algumas conversas com este empresário chegamos juntos à conclusão de que um profissional, para executar a função que ele exercia deveria ganhar R$ 8 mil mensais e que este era o número ideal para ser o pró-labore. Outro elemento que ele entendeu, mesmo com dificuldade, foi que as contas pessoais poderiam ser levadas para a empresa pagar, desde que ele entendesse que a empresa só podia ser usada como boy para efetuar o pagamento bancário, ou seja, as contas a que me refiro continuariam a ser pagas pelo pró-labore. Isso quer dizer que se ele recebe R$ 8 mil reais e tem contas no total de R$ 1 mil, a empresa depositaria apenas R$ 7 mil para o sócio. É importante que estas despesas estejam lançadas no caixa como pró-labore e não como conta da companhia para não serem confundidas com as despesas que são eram realmente da empresa.

Outro elemento é a Distribuição de Lucros, pois uma vez definido, como no exemplo acima, que o pró-labore ideal seria R$ 8 mil, o empresário entendeu melhor os limites da empresa, ficando mais fácil perceber que não seria possível fazer retiradas de lucro, senão nos meses em que a empresa tivesse lastro para tal. Implica dizer que tais retiradas não seriam feitas regularmente, a não ser que houvesse possibilidade. Depois de entender este conceito fica mais fácil compreender a situação de uma empresa com dois sócios, onde apenas um deles trabalha na empresa e o outro é um sócio capitalista. Este não trabalha diretamente, não deve ter pró-labore, que é para quem está incluído no custo da companhia. O sócio capitalista retira rendimentos através da Distribuição de Lucros de acordo com sua participação na sociedade nos meses que for possível. Isso quer dizer que nem sempre haverá valores a serem retirados por este sócio já que estamos falando de dividendos. Em determinada situação, pode também haver pró-labores distintos para sócios com partes iguais na empresa. Isso acontece quando um dos sócios tem uma especialização em algo que agregue mais valor à empresa. Neste caso, seriam valores de pró-labores diferentes e Distribuições de Lucro idênticas, uma vez que a sociedade possui cotas semelhantes.

Imagine o exemplo de dois sócios, um médico e outro enfermeiro, ambos recém-formados, que montam uma clínica com 50% na sociedade cada. Ambos vão envelhecendo, e o médico se transforma num cirurgião plástico, ao passo que o enfermeiro continua com as habilidades que tinha no início da sociedade. Neste caso o sócio médico-cirurgião deve ganhar um pró-labore maior do que o sócio enfermeiro, pois se a clínica contratasse profissionais para substituí-los, lhes pagaria valores distintos. Porém, depois de apurado o lucro mensal, os sócios fariam retiradas idênticas, uma vez que são sócios de partes iguais. Desta forma, fica claro que se trata de coisas distintas, mas igualmente importantes. É fundamental que os sócios entendam que a empresa lhes paga com base no resultado, e para que este resultado seja calculado corretamente é importante que as retiradas sejam classificadas de maneira apropriada. Muitas empresas quebram por má gestão financeira e a essência pode estar nesta confusão elementar entre Pró-Labore e Lucro.

Para maior compreensão, segue um ‘case’ para reflexão: O objeto deste estudo é uma empresa de fabricação de estofados. O negócio era familiar, com quadro societário composto por três irmãos. Atuava no mercado havia trinta e cinco anos e era considerada bem-sucedida, já que seu portfólio de clientes era composto de grandes redes nacionais de varejo. Durante o período de inflação alta tudo ia bem, já que os aumentos nos custos eram compensados pelos aumentos nos preços de vendas. O despreparo administrativo e gerencial era encoberto pelos ganhos com as altas taxas de inflação, que provocavam aumento diário nos preços. Com a chegada do Plano Real a forma de administração praticada não mudou. Os dirigentes continuaram a retirar o pró-labore que ‘NECESSITAVAM’ e, um pouco mais por conta de prováveis ‘lucros’. A reforma e ampliação da casa eram necessárias, mas continuavam a trocar o carro particular pelo modelo do ano. Os investimentos eram feitos sem planejamento. Os ganhos não mais eram suficientes para o cumprimento das obrigações geradas pela atividade, partindo então em busca de capital de giro em bancos, instituições de crédito e particulares, para cobrir os custos de produção, pagamentos de fornecedores e, naturalmente, as retiradas mensais dos sócios. Pouco tempo depois, as contas começaram a ser pagas com atraso, já que não existiam recursos suficientes sequer para as despesas operacionais, menos ainda para quitação dos empréstimos contraídos.

Atrasos gerando juros e multa, não havia mais dinheiro suficiente, razão pela qual os impostos e contribuições sociais também deixaram de ser pagos. Na desesperada tentativa de sobreviver, as vendas feitas pela empresa eram fechadas pelo preço determinado pelo cliente, após tentativas frustradas de aplicar a nova tabela de preços. A justificativa para tais negócios era de que se não houvesse vendas e o mercado fosse perdido, seria pior. Por fim, havia os funcionários (em torno de 100) e suas famílias que dependiam do salário para viver, os sócios que dependiam da empresa e não só financeiramente, pois além de não terem nenhuma reserva financeira, não tinham nenhum diploma e trabalhar na empresa era só o que sabiam fazer. As dívidas cresciam assustadoramente, agora engordadas pela inadimplência, pelos juros e pelo prejuízo da atividade. Não havia mais crédito. Os fornecedores (apenas alguns considerados essenciais) só entregavam os insumos necessários à produção com pagamento antecipado, acrescido do percentual do parcelamento já acordado, da dívida acumulada até então. Era o caos. Os funcionários, que já estavam com salários atrasados, começaram a ficar sem receber. A alternativa foi faturar os pedidos de vendas, antes mesmo de serem produzidos, utilizando os títulos de crédito (duplicatas) gerados com prazo de vencimento superior ao acordado com os clientes (para dar tempo de produzir e entregar), antecipando o recebimento dos escassos recursos, com desconto perante a agiotas, como único meio de gerar caixa nessa fase. Era o fim. O dinheiro teve de ser dividido entre funcionários, sócios e despesas essenciais, como a conta de luz (o fornecimento estava prestes a ser cortado por falta de pagamento) e não sobrou nenhum recurso para pagar a matéria-prima necessária à produção dos estofados já faturados, cujo título de crédito indevidamente emitido, que deu origem a esse mesmo dinheiro, havia sido vendido a terceiros. Sobreveio a falência.

O desaparecimento da empresa provocou não só danos materiais, mas também sociais: as famílias dos funcionários perderam seu sustento, já que estes aumentaram as filas do desemprego, ocasionando oscilação negativa na pequena economia local por falta de consumo. Os sócios perderam tudo o que construíram ao longo dos trinta e cinco anos. Todos os bens de propriedade da empresa foram declarados indisponíveis e leiloados para pagamento de reclamatórias trabalhistas e débitos com a União. Aos sócios, coube o título de “falidos” com todas as consequências e restrições que perdurarão até a subscrição, pois não havia a menor possibilidade de pagamento dos débitos com recursos pessoais, pois nada de material lhes restara a não ser mais dívidas pessoais. Quanto à empresa, foi mais uma que morreu.

O tema principal deste caso é confusão feita entre as necessidades dos sócios e as da empresa. Fazendo com que a companhia pagasse por estas dívidas, sem ter nenhum planejamento quanto as condições de suprir tais retiradas. O fato de confundirem ‘Fluxo de Caixa’ com ‘Lucros’ os fazia retirar mais dinheiro do que a empresa tinha capacidade de suportar, não sobrando recursos para novos investimentos, incorrendo em erro grave de gestão financeira. Para concluir, lembre-se de que a empresa é uma coisa completamente diferente dos sócios. O mundo ideal é a empresa ser mais rica do que os proprietários e ter mais investimentos do que eles, visto que esta ganha dinheiro enquanto o sócio gasta. A empresa é um Centro de Receita e o sócio um Centro de Despesa, não tendo nada a ver uma coisa com a outra. O fato de a empresa ter muito dinheiro em caixa não quer dizer que o sócio possa ficar trocando de carro pessoal o tempo inteiro. A empresa pode dar, matematicamente, Pró-Labore e Lucro para os sócios na medida da eficiência da mesma, o que não significa que a empresa tenha que suprir o padrão que os sócios desejam.

Pense, reflita e tome as melhores decisões!

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